O poder da ausência

Liandra Vianna
4 min readOct 20, 2020

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Recentemente assisti a uma TED Talk de Kristine Tompkins sobre o projeto de preservação ambiental que ela e seu marido iniciaram na Patagônia, mas o que mais me chamou atenção foi o seu relato de como a ausência de algo, que nos é muito querido, pode nos motivar a fazer mudanças e tomar atitudes revolucionárias em nossas vidas. Ela diz que “coisas valiosas podem ser melhores compreendidas e valorizadas, não pela sua presença, mas sim pela sua ausência”, e completa que “o poder da ausência não pode nos mover para frente se apenas desperta nostalgia e desespero, mas nos é útil, quando nos motiva a trazer de volta algo que sentimos falta”.

Fazendo um paralelo com as três grandes ausências que vivi nos últimos anos com a morte de entes muito próximos e queridos a mim, percebi que apenas quando os perdi definitivamente, pude aprender as lições de vida mais importantes que eles me deixaram e pretendo compartilhá-las aqui. Tais aprendizados não vieram por meio de discursos, sermões, brigas ou conversas que tivemos, mas de exemplos de vida que eles me deram através de suas ações.

Nos últimos anos tenho tentado aplicar o “mantra” de que “é durante os períodos de maior sofrimento, que mais aprendemos e evoluímos”, em toda e qualquer situação que me deparo na vida e a perda de pessoas tão importantes não poderia passar sem que eu tirasse algum aprendizado delas. O psicólogo e palestrante Rossandro Klinjey, diz em um de seus vídeos que a morte de uma pessoa é apenas uma fotografia de um longo filme que vivemos com ela e, baseada nesse pensamento, fiz uma retrospectiva dos filmes que tive o privilégio de contracenar com meus familiares.

Durante os últimos 5 anos de vida de minha mãe, ela só fazia planos para sua aposentadoria, que estava próxima. Devido a sua paixão por viajar e entusiasmo pela fotografia, dizia que assim que se aposentasse faria um curso de fotografia e viajaria o mundo tirando fotos belíssimas de todos os lugares que visitasse. Comprou uma câmera semiprofissional e estava mentalmente fazendo uma lista dos países que queria conhecer. Entretanto, três meses após se aposentar e mudar para a cidade do interior que tanto gostava, ela foi diagnosticada com câncer no intestino e duas semanas depois ela nos deixou. A lição aprendida: se você quer muito fazer ou aprender algo, faça agora! ou o mais rápido que puder. Não espere ter as condições ideais de temperatura e pressão para realizar seus sonhos. Coloque seus objetivos como prioridade e estabeleça prazos próximos para torná-los realidade ou iniciá-los. Sem adiar, sem dar desculpas e sem colocá-los nas mãos de terceiros ou de fatores externos. Faça logo e faça rápido, porque nunca se sabe quando será tarde demais.

Meu avô era o mais velho de 16 filhos e um dos poucos que conseguiu cursar uma faculdade e ser bem sucedido naquilo que escolheu fazer. Apesar de ter sido criado em moldes ainda bem machistas, após ter tido duas filhas e posteriormente uma neta, ele aprendeu com a vida que teria que mudar sua forma de pensar e agir, se quisesse que suas filhas tivessem uma vida plena e bem sucedida como a dele. Logo, ele se tornou o maior incentivador de todas nós. Nos ensinou a dirigir bem cedo, nos apoiou em todas as decisões que tomamos, nos incentivou a estudar e a aprender outras línguas, e quando eu disse que queria conhecer o mundo ele foi o primeiro a dizer “vai!”. O que ele me ensinou? Que quando amamos alguém, temos que ser os primeiros a impulsionar os sonhos daquela pessoa, a colocá-las SEMPRE pra cima e a querer que eles cresçam, independentemente de onde, como e quando será.

Ao longo de toda a minha vida, escutei de todos que meu pai era um desperdício de inteligência, que ele poderia estar rico e que ninguém conseguia entender suas escolhas por uma vida mais simples. Por ser autodidata e extremamente inteligente, apesar do pouco estudo que teve, ele sempre cresceu mais do que os colegas em qualquer trabalho que fazia, chamava a atenção de seus superiores positivamente e tudo indicava que tinha um futuro promissor. Por isso, foi um choque quando ele decidiu deixar seu emprego fixo na metrópole, se mudar para o interior e abrir seu próprio negócio. Ele trabalhava por conta própria, fazia seus horários, tinha tempo para se exercitar, se dedicar aos seus hobbies, mas de vez em quando passava por uns apertos financeiros. Foi severamente criticado por uma boa parte de sua vida adulta, mas parecia estar mais do que satisfeito com a vida que escolheu pra si e a defendia contra tudo e todos. A lição: não viva de acordo com as expectativas dos outros e sim de acordo com o que faz sentido pra você. Faça suas escolhas e lute para que elas deem certo.

O que todas essas perdas me ensinaram em conjunto foi a aproveitar ao máximo a compania das pessoas importantes que temos ao nosso redor, enquanto elas ainda estão aqui; deixar desavenças de lado e focar nos aspectos que nos unem e não naqueles que nos diferenciam; sempre que o pensamento for até alguém, mandar uma mensagem, ligar ou visitar assim que possível; compartilhar momentos felizes, para que mesmo de longe, as pessoas que amamos possam fazer parte da nossa vida, e por fim, prestar atenção no filme enquanto ele passa e não focar na fotografia de quando ele acaba.

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Written by Liandra Vianna

Service Designer, passionate about learning languages and solving problems. Sharing experiences & lessons learned.

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